(sublinhados meus)
Email Aberto a Marcelo
Um bocadinho menos de graxa a Paddy Cosgrove e mais pulso no que se passa no dia a dia dos Portugueses era o mínimo que poderia ter feito.
Escrevo-lhe hoje, Presidente Marcelo, com o intuito de lhe dar uma pequena perspectiva do seu legado como Presidente da República Portuguesa. Visto ser um email, tentarei ser breve. Senti o impulso de o escrever depois de um passeio que dei pela Baixa de Lisboa na tarde da véspera de Natal. Passava pela Rua Garrett, quando notei um presépio. Fechado a grade, ladeado de cadeados, sem iluminação. Na véspera de Natal um país de matriz Cristã, nem consegue ter um presépio iluminado numa zona proeminente. Continuando a descida, vejo que a rua Augusta foi convertida numa feira ambulante onde nada vendido tem qualquer conexão com Portugal. Que turismo teremos, quando Lisboa se tornar exatamente o mesmo que qualquer outra cidade Europeia? O turismo advém da particularidade de um local, não da sua multiculturalidade.
Passei na minha adolescência tempos felizes entre a Baixa de Lisboa e Almada. Paragem rápida pela Igreja de S. Nicolau (a Igreja mais bonita de Lisboa), fumava um pau de canela (tinha 16 anos) entre amigos e conversas embaraçosas de adolescente. Apanhava depois o barco para Cacilhas. Sem medos. Quanto tiver filhas e filhos quero que tenham a oportunidade de desfrutar da Lisboa, Almada e Caparica em que cresci. Por muito que goste de Inverness, prefiro que cresçam com sol e caldo verde do que com haggis e ventos do mar do Norte. Que aproveitem as tardes para passear por Lisboa, em segurança, sem medo de gangues, drogas e violência. Possam apanhar o cacilheiro em paz e sossego, e entrar numa Almada viva e entusiasmante. Não serem números nalguma folha de cálculo do Governo, prontas a ser exportadas para o mundo. Custa ver as ruas de Almada, a minha primeira morada, maltratadas e ao abandono. Ver a Igreja onde fui baptizado cada vez mais vazia. E continuamos a falar de acolher, enquanto tudo degenera a olhos vistos. Quando se acabarem os garibaldis do Condestável, e as bicas do café Páscoa, o que sobra?
Nos últimos anos esteve mais preocupado em promover reparações a países que já são independentes há meio século. Deveríamos também investigar o trajecto do ouro e a prata que os cartagineses exploraram na península Ibérica? Fazemos contas com o Norte de África? Escolher o ponto de partida das reparações revela o mesmo carácter arbitrário que parece ser aplicado aos que querem o aborto como bandeira do progresso. Como se não bastassem as recentes crises económicas, a pandemia e instabilidade laboral, quer também agora impor a mim e aos meus a responsabilidade sobre eventos acontecidos quando ainda não tínhamos sido concebidos? Sob a sua alçada, tentaram pela calada retirar os direitos de cidadãos Portugueses a residir no estrangeiro de aceder ao serviço nacional de saúde. Nos consulados Portugueses (Reino Unido), o Confucionismo e a total ausência de simpatia para com os Portugueses demonstram por quem os seus sinos dobram. Vi, preocupado, o rol de más decisões que fez, como a estranha reabilitação de António Costa. Então António Costa não serve para Portugal, mas serve para a Europa, com o seu inglês macarrónico e uma condecoração por si atribuída? Condecora quem não deve, não quer saber dos que dia a dia vão sobrevivendo, dos que se esfolaram a trabalhar, entre cursos superiores e quatro empregos part-time, para depois serem humilhados por uma classe política que os não quer cá.
Os conflitos culturais que são cada vez mais visíveis no Reino Unido, e nos quais Keir Starmer, primeiro- ministro Britânico, continua a não estar particularmente interessado (embora já fossem descortinados há uma década por Douglas Murray, mas ninguém quis ouvir) estão finalmente a ser expostos. Também em Portugal a diário temos agora situações tão bicudas que nem a palavra sensações consegue mascarar a natureza da insegurança vivida. Não é normal indivíduos acenderem fogueiras ao pé do Cais do Sodré no meio de um dia de calor. Não é normal que na estação de serviço do Fundão a casa de banho das mulheres seja tomada por homens de idade militar e que tenha que ser eu e a minha mãe a desbloquear o caminho para que as senhoras que estavam à espera a possam utilizar. Não é normal que na Avenida da Igreja, senhoras de idade confidenciem que já quase não vão à Missa, pois têm medo de sair à rua. E continua a falar de multiculturalismo, de inclusividade. Portugal pode ter muitos unicórnios, mas o mundo não é um. Um bocadinho menos de graxa a Paddy Cosgrove e mais pulso no que se passa no dia a dia dos Portugueses era o mínimo que poderia ter feito.
No seu mais recente discurso voltou com as mesmas platitudes, encheu a boca de abrilismos, do discurso de todos, sem indicar nada de concreto. A verdadeira liberdade vem da escolha. A multiculturalidade, pluralismo e diplomacia são uma arte de saber o que aceitar e o que não aceitar. Não escolher nada e querer tudo é apenas uma fogueira de vaidades, vanidades e banalidades. A coesão e alta confiança que produz sociedades harmoniosas exige a presença de escrutínio nas políticas de acolhimento e imigracão. E isto inclui operações policiais, quando um bairro se torna perigoso para os residentes. Um dos maiores extremismos que temos é o da cobardia. Políticos como o senhor tinham a responsabilidade de proteger as operações policiais que nos mantêm seguros, e não lançar farpas mal disfarçadas em discursos redundantes.
Deveria dar-lhe pausa para reflectir que cientistas têm agora que se desdobrar e escrever sobre a situação social e política Portuguesa. Mas a qualidade de vida ficou tão visivelmente deteriorada, a sua falta de carinho pelos Portugueses que não querem ter de abandonar o país, e a total ausência de pulso pela insegurança e falta de serviços em todo o país (para quando a linha da Beira Alta?) assim o requer. Não tenho amigos na política, não tenho curso em ciência política, não faço parte de nenhum grupo de activismo; e, no entanto, parece que percebo a situação atual bastante melhor que a maioria dos deputados da Assembleia da República, amedrontados pelo açaime da cobardia. Não se torne Portugal um pleonasmo de Emigração. Não vou abandonar o país. Farei o que puder, com as parcas capacidades que tenho, para contribuir para o crescimento de Portugal, mesmo que as políticas dos sucessivos governos não me queiram cá. Usarei do verdadeiro internacionalismo, não para sair do país, mas para cumprir o que outros apenas apregoam.
Todas estas suas atitudes têm impacto no próprio conceito da Defesa Nacional. Quem, exatamente, vai defender a zona económica em que Portugal, a par e passo com outras capitais europeias, se tornou? Se não há uma matriz cultural a respeitar, de onde vem o dever para com o país? Mas nada disto lhe interessa. Quer apenas apregoar um multiculturalismo oco, vazio, sem alma. Volte a ler e comentar livros, o seu nicho. Para isso tem algum talento. Recomendo o conto “Sete Andares” de Dino Buzzati, um curto esboço que pode inspirar alguma reflexão sobre o que se passa na Europa. Percorra este verão os caminhos de Santiago e pense no que fez em relação aos Portugueses e ao país. E, por favor, não apague este email.