quarta-feira, 27 de maio de 2020

Entrevista - Rentes de Carvalho

(sublinhados meus)

"Achei divertido um ministro holandês dizer em voz alta o que se cochichava sobre Portugal"

J. Rentes de Carvalho abandona Portugal em 1956. Volta à aldeia de Estevais todos os anos, mas além desse regresso nada mais do que os livros que escreve, a maioria sobre o nosso país. Não deixa a Holanda por nada.

O escritor J. Rentes de Carvalho ganhou fama literária na Holanda, um filho gerado em Estevais de Mogadouro e nascido em Vila Nova de Gaia e que, segundo a sua biografia online, é "neto de um sapateiro e de um guarda fiscal, frequentou o liceu no Porto, em Viana do Castelo e em Vila Real. Estudou Línguas Românicas e Direito nas faculdades de Letras e de Direito da Universidade de Lisboa, após o que, por razões políticas, foi obrigado a deixar Portugal. Viveu no Rio de Janeiro, em São Paulo, Nova Iorque e Paris. Trabalhou como jornalista para O Estado de S. Paulo, o Correio PaulistanoO Globo e na revista O Cruzeiro. Mudou-se para Amesterdão em 1956, para trabalhar na embaixada brasileira. Colaborou com o Diário Popular e depois com o Expresso. Fez um mestrado na Universidade de Amesterdão, apresentando uma tese intitulada "O povo na obra de Raul Brandão". Após a reforma continuou a carreira de jornalista e romancista (...)." Aqui chegados, Rentes foi descoberto em Portugal e a sua obra - toda focada no nosso país - editada. As suas narrativas falam de um Portugal que nos nossos escritores passa ao lado e num conjunto de ensaios que provocam perguntas que, mais uma vez, pouco interessam aos nossos ensaístas. Viver na Holanda, de onde saem frequentes bojardas políticas nonsense contra os países do Sul, é um bom pretexto para entrevistar um autor que faz no dia 15 os seus 90 anos. Nada que o impeça de provocar os que obedecem cegos à quarentena e ultrapassam os piores receios do Big Brother imaginado por Orwell.
Esperava ver na sua longa vida a situação em que todo o mundo está devido à pandemia?
Não esperava, porque na minha ingenuidade epidemia ou pandemia não era desastre que me assustasse, e isso pela simples razão de acreditar que a ciência sempre levaria a melhor. Infelizmente assim não é. De modo que me vejo obrigado a perder mais essa ilusão e também outra que tinha: a de supor que como catástrofe as guerras seriam o pior que nos podia acontecer. Para mal de todos, esta situação causa vagas de medo que nada prenunciam de bom e podem espoletar inesperadas transformações políticas e sociais, dando razão ao provérbio que diz que o medo é mau conselheiro.


A situação vai ao encontro do que escreveu num seu livro há quatro anos, A Ira de Deus sobre a Europa: "Desde os 15 até aos 86 anos que agora conto, a minha visão do mundo e da história tem sido um suceder de decepções políticas, sonhos desfeitos, promessas mentidas, amanhãs contrários." Ou seja, nada mudou?
Talvez tenham mudado as técnicas da manipulação, hoje tão bem aceites, em que os boatos de antigamente são agora as fake news que à vontade do freguês servem para desestabilizar, influenciar, preparar e, em certas circunstâncias, até para ajudar à solução de uma crise. Tenho ideia de que vivemos num mundo em que a realidade muitas vezes cede à ficção, fabricada com desagradáveis intenções e para benefício de poucos.
Esta doença - covid-19 - mereceria um romance ou preferia ter como protagonistas de um livro governantes da União Europeia que tomassem decisões para manterem vivo e atual este Velho Continente?
De certeza optava pelos mandarins da União Europeia, pois formam uma interessante casta que, como todas as castas desde o princípio do mundo, cuida em primeiro lugar dos seus interesses e depois, ineficaz como sempre foram todas as burocracias, morosamente vai dando uma no cravo e outra na ferradura, com a, para ela agradável, certeza de que, porque não os elegeram, os cidadãos não lhes podem pedir contas.
Posso deduzir que não é um grande adepto da forma que tomou esta União Europeia?
Não pode, porque sou adepto da União Europeia desde a fundação; aplaudo o que ela tem feito de construtivo, não me queixo das possibilidades que oferece a toda a espécie de burlões e traficantes. Como português estou-lhe grato pelo muito que nos tem dado, pois sem ela teríamos continuado um país do terceiro mundo. Isso, contudo, não quer dizer que ande de olhos fechados para a situação em que a União se encontra ou ignore os jogos de interesses e de poder, que mostram não se tratar de um organismo verdadeiramente democrático, mas um em que manda quem pode.
Confessava nesse livro que receava mais que a Europa fosse presa fácil do islão, que o Brexit viesse a acontecer, a permissividade holandesa perante os refugiados, e que a União Europeia mais lhe parecia o Titanic. Mudou de opinião com o passar destes anos ou a atual Europa está no seu pior estágio?
Pior não saberia dizer, mas a União Europeia nem vai conseguir ser aquele poder que se senta à mesa como igual dos Estados Unidos ou da China, além do mais porque sob a aparência de união nem é preciso mencionar o Brexit como sintoma de que o edifício é frágil, está à mercê de abalos que não precisam de ser muito fortes para levarem a um terramoto em que todos perderão, tanto os que a financiam como os que dependem dos seus subsídios para sobreviver.
Confinado há semanas, ponderou sobre até que ponto este vírus será capaz de mudar os valores das sociedades ou não acredita nesse virar das atitudes?
Gostaria de ser profeta, daqueles que anunciam boas novas, mas para ser franco devo dizer que nada do que aconteceu no mundo desde que nasci me causou um abalo tão forte como o que esta pandemia prenuncia. E não falo das mortes, pois de uma maneira ou de outra é esse o nosso destino, mas deste medo generalizado que pode levar a mudanças radicais. Assusta-me ver como as pessoas tão docilmente aceitam medidas que lhes coartam a liberdade, lhes impõem uma quarentena drástica, como as autoridades calam os cientistas que provam a insensatez de tanta obrigação. Assusta-me também a perspetiva de que este ambiente de medo veio para ficar, porque ajuda eficazmente a manter o cidadão assustado, obediente, pronto a denunciar o vizinho que não obedece. Por muito democráticos que sejam ou aparentem ser, todos os governantes sonham com um rebanho dócil, e nenhum é mais agradável do que aquele que sem discutir aceita as ordens do pastor. Em situações assim, e dando esse resultado, pouco importa se o rótulo é do centro, dos extremos ou das alturas, socialista, comunista, liberal ou monárquico, o que conta é que o povo tenha medo. E o medo que já está connosco vai ficar, como vai ficar e crescer a nova casta de comentadores que tudo sabem de virologias, epidemias, cuidados intensivos, febres, contágios, etc. Numa questão de meses esses ultrapassaram já os comentadores da política e da economia, serão eles os novos e muito eficientes lacaios do poder, vão subir ao estrelato os que melhor souberem assustar.
"Se estou em Portugal, torna-se-me difícil ser severo." Fazia esta reflexão em Pó, Cinza e Recordações. Em Amesterdão é-lhe mais fácil dizer o que pensa deste país?
Não é, só que quando estou em Portugal dá-me mais pena o confronto com o que vai mal, a ingénua ou fingida docilidade com que o povo se deixa enganar, a confiança que continua a ter no jeito e na cunha, do que resulta uma sociedade que não acredita no poder que tem e por desleixo ou preguiça acomoda-se na passividade, iludindo-se de que o passo de caracol também é um avanço.
Já jurou que se renascesse após esta vida desejava que fosse sob a forma de holandês - não como estrangeiro mas aí nascido. Mantém esse "projeto"?
Acho que não, porque se renascesse holandês iria ter menos razões para me rebelar, por isso tenho a intenção de recomeçar por Vila Nova de Gaia e fazer um caminho que, pelo menos, seja tão interessante e variado como este que percorro há 90 anos.
Há umas semanas, o primeiro-ministro António Costa considerou "repugnante" a intervenção de um ministro holandês. Revê-se na acusação portuguesa, principalmente quando - estranhamente - estava a defender a "rival" Espanha?
De modo geral, as explosões verbais dos políticos não podem ser levadas a sério, menos ainda neste caso em que o sentimento de "repugnância" era um efeito teatral dirigido à plateia, pois quando se sentam à mesa para tomar decisões todos eles sabem que não manda quem mais berra a exigir, mas quem tem a carteira na mão e nos dedos o poder de desapertar os cordões.
Já não é a primeira vez que um governante holandês se "atira" a Portugal. O ministro das Finanças, Jeroen Dijsselbloem, disse em 2017 que os países do Sul "gastavam todo o dinheiro em copos e mulheres e depois pedem ajuda". O que achou dessa declaração?
Achei divertido, porque foi involuntário e um exemplar lapsus linguae do que um ministro da Holanda diz em voz alta e de maneira pouco diplomática o que entre colegas se cochichava. Um passo em falso de que ele próprio mais tarde pediu desculpa, mas com desculpas ou sem elas a impressão do esbanjamento meridional continua presente.
Apesar de viver na Holanda há tantos anos, ainda sente algum constrangimento em relação ao português que existe em si ou tratam-no como um deles?
Constrangimento? Bem ao contrário, de facto alguém que ganhou o direito de pertencer.
Faça a busca do meu nome no Google, verá que as entradas holandesas excedem as portuguesas. Perdoe a involuntária vaidade a que me obriga: na Holanda consideram-me um escritor holandês e têm honra nisso, ao longo dos muitos anos tanto as pessoas, como as autoridades, os políticos, os burgomestres de Amesterdão, ministros de vários governos e a própria Família Real, sempre me acolheram com excecionais provas de carinho e cordialidade. Ainda no Google, procure no Arquivo de Amesterdão - Stadsarchief Amsterdam - Rentes de Carvalho e verá que a cidade lá guarda o meu retrato entre os que se orgulha de que nela vivem, trabalham e contam.
Neste ano vai a passar uns dias na aldeia de Estevais ou é melhor ficar por Amesterdão?
Tinha as malas prontas, as reservas feitas, estava a dois dias da partida quando a quarentena me apanhou. Desde então vivo confinado, mas com suficientes possibilidades de movimento. No dia em que terminarem as medidas e a autoestrada estiver aberta ponho-me a caminho, com a intenção de desta vez não passar dias mas meses na minha aldeia.
O exílio e a opção de vida na Holanda alteraram a sua forma de ser?
Creio que sim, e muito. Pela oportunidade que me deram de aprender e de relativizar, de tentar ser menos impulsivo nas minhas razões e nas minhas certezas, de temperar o nervosismo mediterrânico com uns pozinhos de frieza nórdica.
Os europeus do Norte desdenham mesmo os do Sul ou são mais fake news?
Não desdenham e a prova dão-na eles próprios, que aos milhões correm para os países onde o sol brilha mais e mais tempo, gozam umas semanas de vida meridional e regressam contentes. O caso é que os nórdicos esforçam-se por poupar, ter a casa em ordem, confiam nos governos e nas instituições e fazem quanto podem para que o futuro dos seus filhos seja melhor do que o deles. Ao mesmo tempo veem que uma boa fatia das suas poupanças é dada aos países meridionais a fundo perdido, e esses surpreendem-nos, não só por se mostrarem desagradecidos mas por, ainda por cima, terem a lata de lhes chamar repugnantes. O pedinte a insultar quem o favorece é uma situação que mesmo numa comédia teatral seria insólita.
Já comparou os hospitais holandeses aos portugueses, dizendo que quando frequentava os de cá sentia necessidade de se "obrigar a um sangue-frio holandês". Depois desta pandemia, mantém a opinião?
Acho que sim, o ambiente continua calmo e contido, são muito raras as expressões públicas de dor, mesmo os emigrantes e os refugiados parecem ter aprendido a aceitar que os gritos e as lágrimas se reservam para a intimidade, que a cada um já basta o próprio sofrimento, não fica bem afligi-lo com o nosso.
Entre a maioria dos países europeus, Portugal foi dos que reagiram melhor à covid-19 e teve menos mortes e infetados. Não preferia ter feito o seu confinamento por cá?
Como sou fatalista, quando tiver chegado a hora de ser infetado e morrer, o vírus não vai levar em conta o lugar onde me encontro. Em matéria de confinamento, as medidas na Holanda são menos drásticas do que as adotadas em Portugal e, por conseguinte, menos desagradáveis. Para mim foi o acaso que escolheu e é o menor dos males.
No diário que publicou evoca o primeiro dia de 2000 e afirma: "O mundo não acabou." Se mantivesse um diário, o que iria escrever no dia em que seja declarado o fim desta pandemia mundial?
A declaração do fim da epidemia será para inglês ver, os políticos ainda não se recompuseram da enorme surpresa deste inesperado maná que lhes permitiu cortar sem oposição nem dor nas liberdades, lhes ensinou que o caminho está aberto para cortar mais fundo e de modo permanente. O rebanho aceita a quarentena, a perda de liberdade - temporária, prometem eles -, a perda da vida social, o carnaval das máscaras, a paródia da desinfeção constante, as luvas, o termómetro à entrada do restaurante, o fim dos abraços, dos beijos, dos apertos de mão, enfim, de tudo o que é intrinsecamente humano e mostra de amor, carinho, amizade, vida social. É o mundo que George Orwell previu, um mundo de fracos, medrosos e subservientes.
Ou seja, nunca imaginou ser possível uma tão grande redução dos direitos das pessoas sem a eleição de um populista ou de um golpe de estado à escala mundial?
Em matéria de catástrofes, a minha imaginação tem tendência para disparar, mas em momento nenhum me ocorreu que isto poderia acontecer, como ainda considero incrível o pouco valor que os indivíduos dão à liberdade e o tremendo poder do medo. Aliado às facilidades de comunicação, vemos que o medo reduz o mundo às dimensões de uma aldeia, com as terríveis consequências que a pequenez acarreta. O próximo já não é um chileno da Patagónia ou um chinês de Pequim, mas um nosso vizinho, razão de sobra para o temer e odiar quando nos parece um assassino potencial. Mais um abalo depois deste e temo que vamos riscar do vocabulário a palavra solidariedade.
Uma das suas melhores tiradas político-literárias está na comparação entre o que Soljenítsin disse - "Um grande escritor é um segundo governo" - e que os autores contemporâneos portugueses mais não são do que "uma junta de freguesia". De que mal sofre a nossa literatura atual?
Não direi que é um mal, mas uma maneira de ser. Por volta dos anos 1960, a nossa literatura deixou de se interessar pelo país e passou a ser a expressão dos desejos, dos sonhos e das aflições lisboetas, com tudo o que isso pode ter de mesquinho, pequeno-burguês, de autossatisfação e sobranceria. A literatura portuguesa não conhece nem se interessa por Portugal, vive entre as Avenidas Novas e Cascais e o resto do país é um território estranho habitado por gente tosca e pobre, com hábitos, emoções e problemas que não são deste tempo nem merecem atenção.
Afirmou que foram muito poucos os escritores portugueses que se opuseram ao anterior regime e que a nossa literatura nunca foi de revolta. O que fez e faz falta aos autores?
Sair de Lisboa, procurar outros ares, descobrir que se respira mal no Chiado e trocar a poluição pela frescura do Minho ou do Gerês. Deixar de olhar para o que se escreve nos Estados Unidos com o mesmo pasmo e inveja com que antigamente se olhava para a França, e talvez também descobrir que a nossa língua é um extraordinário, melodioso, rico e refinado instrumento, que merece e necessita de mais e melhor atenção do que a que lhe dão as escolas, as universidades e os próprios escritores.
Num dos seus livros recorda que a PIDE censurava os horóscopos do signo Touro, que era o de Salazar. Estava a ser irónico?
Não estava. Era mesmo assim e tenho pena de ter perdido o recorte do Diário Popular onde li que a censura era fiel nesse cuidado.
"Houve um tempo em que eu confiava cegamente na memória. Hoje, com mais modéstia e maior cautela, mesmo as recordações de ontem me parecem infiéis e duvidosas." Ainda subscreve estas palavras que estão em Os Lindos Braços da Júlia da Farmácia?
De facto, ainda assim é e quanto mais avanço em anos mais filtros vou pondo nas recordações. O lado negativo desses filtros é a canseira que dão e as dúvidas que acarretam, porque tudo isso impede o entusiasmo e empresta aos anciãos uma imagem de calma e sabedoria, quando na realidade é apenas fadiga e aborrecimento.
Em Portugal, a Flor e a Foice não deixa pedra sobre pedra no que respeita à identidade nacional. Recorre ao historiador C.R. Boxer para afirmar: "Os portugueses têm demonstrado ao longo dos séculos uma notável capacidade de sobrevivência à má governação, vinda de cima, e à indisciplina, vinda de baixo." Para si, este país não tem cura?
Creio que nos anos que ainda me restam de certeza não terá, e também me arrisco a afirmar que nas duas próximas gerações ainda não vai ter. Depois será o que Deus quiser e o meu receio é que o Todo-Poderoso uma tarde se impaciente, tenha um acesso de mau humor, decida que não valemos os aborrecimentos que damos e opte por uma solução drástica.
Cita frequentemente o historiador Oliveira Martins. Acha que os fazedores de história contemporâneos não lhe chegam à altura e são mais uma espécie de redes sociais da história?
Nas universidades e no público os historiadores estão hoje, o que é um desastre e grande pena, relegados a um lugar menor. Perderam muito da sua importância e da influência que tinham, as suas opiniões tornaram-se quase só notas de rodapé que os jornalistas usam quando fingem querer dar peso ao que escrevem. Há poucos com grande competência e são cada vez menos os que lhes prestam atenção.
Nunca sentiu vontade de voltar a contar a história portuguesa como já fez ou de 1975 para cá pouco aconteceu?
Se fosse historiador, o que aconteceu desde 1975 de certeza me interessaria, mas o que Portugal espera e precisa é de um Balzac que aproveite o manancial de personagens bizarros e exemplares de corrupção, de pulhice, madraçaria, baixeza, falta de vergonha e maus costumes, que de longe ultrapassam os que antes estiveram no poder. Verdadeira mina de ouro, merece que um grande talento a saiba aproveitar.
Quando diz os "que antes estiveram no poder", refere-se àqueles que o fizeram abandonar Portugal?
Certamente, mas, vistos à escala dos corruptos que atualmente infestam a nossa sociedade e os organismos do Estado, os mandarins de então eram uns pobretanas. Poderiam deitar mão a uns contos de réis, mas nunca, mesmo nos sonhos mais delirantes, esperariam que os seus filhos e netos arrecadassem milhões.
Considera o enterro do Presidente Sidónio Pais como o momento em que os portugueses "choram a morte de uma ilusão". Depois da imensa multidão no funeral de Salazar, só Álvaro Cunhal teve tantos portugueses a despedirem-se. É um país de extremos?
De extremos só raramente, mas, sim, de choro fácil e das emoções de superfície que denotam ligeireza de carácter e mentalidade de cata-vento, mas também a carinhosa pieguice que muito desculpa e me dá a ideia de ser a marca registada da nossa muito exclusiva e portuguesa maneira de ser.
Em Montedor conta que "quando o tempo está bom subo ao Monte." O livro tem muitas descrições geográficas do Minho, entre outras. Enquanto as escrevia, existia a intenção era matar saudades ou esse sentimento ficou para trás quando teve de se exilar?
De matar saudades não seria, antes uma maneira de registar o que voluntariamente abandonava sem qualquer desejo de retorno, talvez uma estranha vontade de ajustar contas com um meio e uma realidade que queria esquecer e a que não tinha intenção de voltar, ilusão juvenil a que 14 anos de ausência bastaram para pôr fim.
Em O Meças escreve: "Alguém terá de lhe emprestar as palavras." Alguma vez sentiu necessidade de uma ajuda dessas?
Felizmente não. Terei alguma dificuldade em encontrá-las e mais ainda em arranjar maneira que com elas consiga traduzir o sentimento que quero comunicar, mas essa é a pena de trabalhos forçados a que há muito voluntariamente me condenei e espero poder cumprir até ao fim.
Qual é o título do seu próximo livro?
Título? Como assim, se ainda poucas páginas tenho? Mas se o tivesse não diria, é imprudente vender a pele do urso antes de ir à caça.

Reflexão - Yuval Noah Harari

(sublinhados meus)

Yuval Noah Harari: the world after coronavirus | Free to read

This storm will pass. But the choices we make now could change our lives for years to come

Humankind is now facing a global crisis. Perhaps the biggest crisis of our generation. The decisions people and governments take in the next few weeks will probably shape the world for years to come. They will shape not just our healthcare systems but also our economy, politics and culture. We must act quickly and decisively. We should also take into account the long-term consequences of our actions. When choosing between alternatives, we should ask ourselves not only how to overcome the immediate threat, but also what kind of world we will inhabit once the storm passes. Yes, the storm will pass, humankind will survive, most of us will still be alive — but we will inhabit a different world. 
Many short-term emergency measures will become a fixture of life. That is the nature of emergencies. They fast-forward historical processes. Decisions that in normal times could take years of deliberation are passed in a matter of hours. Immature and even dangerous technologies are pressed into service, because the risks of doing nothing are bigger. Entire countries serve as guinea-pigs in large-scale social experiments. What happens when everybody works from home and communicates only at a distance? What happens when entire schools and universities go online? In normal times, governments, businesses and educational boards would never agree to conduct such experiments. But these aren’t normal times. 
In this time of crisis, we face two particularly important choices. The first is between totalitarian surveillance and citizen empowerment. The second is between nationalist isolation and global solidarity. 

Under-the-skin surveillance

In order to stop the epidemic, entire populations need to comply with certain guidelines. There are two main ways of achieving this. One method is for the government to monitor people, and punish those who break the rules. Today, for the first time in human history, technology makes it possible to monitor everyone all the time. Fifty years ago, the KGB couldn’t follow 240m Soviet citizens 24 hours a day, nor could the KGB hope to effectively process all the information gathered. The KGB relied on human agents and analysts, and it just couldn’t place a human agent to follow every citizen. But now governments can rely on ubiquitous sensors and powerful algorithms instead of flesh-and-blood spooks. 



l Colosseo - Roma webcams of Italy project. by Graziano Panfili
The Colosseum in Rome



Piazza Beato Roberto a Salle Pescara webcams of Italy project. by Graziano Panfili
Piazza Beato Roberto in Pescara © Graziano Panfili
In their battle against the coronavirus epidemic several governments have already deployed the new surveillance tools. The most notable case is China. By closely monitoring people’s smartphones, making use of hundreds of millions of face-recognising cameras, and obliging people to check and report their body temperature and medical condition, the Chinese authorities can not only quickly identify suspected coronavirus carriers, but also track their movements and identify anyone they came into contact with. A range of mobile apps warn citizens about their proximity to infected patients. 

About the photography

The images accompanying this article are taken from webcams overlooking the deserted streets of Italy, found and manipulated by Graziano Panfili, a photographer living under lockdown
This kind of technology is not limited to east Asia. Prime Minister Benjamin Netanyahu of Israel recently authorised the Israel Security Agency to deploy surveillance technology normally reserved for battling terrorists to track coronavirus patients. When the relevant parliamentary subcommittee refused to authorise the measure, Netanyahu rammed it through with an “emergency decree”. 
You might argue that there is nothing new about all this. In recent years both governments and corporations have been using ever more sophisticated technologies to track, monitor and manipulate people. Yet if we are not careful, the epidemic might nevertheless mark an important watershed in the history of surveillance. Not only because it might normalise the deployment of mass surveillance tools in countries that have so far rejected them, but even more so because it signifies a dramatic transition from “over the skin” to “under the skin” surveillance. 
Hitherto, when your finger touched the screen of your smartphone and clicked on a link, the government wanted to know what exactly your finger was clicking on. But with coronavirus, the focus of interest shifts. Now the government wants to know the temperature of your finger and the blood-pressure under its skin. 

The emergency pudding

One of the problems we face in working out where we stand on surveillance is that none of us know exactly how we are being surveilled, and what the coming years might bring. Surveillance technology is developing at breakneck speed, and what seemed science-fiction 10 years ago is today old news. As a thought experiment, consider a hypothetical government that demands that every citizen wears a biometric bracelet that monitors body temperature and heart-rate 24 hours a day. The resulting data is hoarded and analysed by government algorithms. The algorithms will know that you are sick even before you know it, and they will also know where you have been, and who you have met. The chains of infection could be drastically shortened, and even cut altogether. Such a system could arguably stop the epidemic in its tracks within days. Sounds wonderful, right?
The downside is, of course, that this would give legitimacy to a terrifying new surveillance system. If you know, for example, that I clicked on a Fox News link rather than a CNN link, that can teach you something about my political views and perhaps even my personality. But if you can monitor what happens to my body temperature, blood pressure and heart-rate as I watch the video clip, you can learn what makes me laugh, what makes me cry, and what makes me really, really angry. 
It is crucial to remember that anger, joy, boredom and love are biological phenomena just like fever and a cough. The same technology that identifies coughs could also identify laughs. If corporations and governments start harvesting our biometric data en masse, they can get to know us far better than we know ourselves, and they can then not just predict our feelings but also manipulate our feelings and sell us anything they want — be it a product or a politician. Biometric monitoring would make Cambridge Analytica’s data hacking tactics look like something from the Stone Age. Imagine North Korea in 2030, when every citizen has to wear a biometric bracelet 24 hours a day. If you listen to a speech by the Great Leader and the bracelet picks up the tell-tale signs of anger, you are done for.



Veduta della casa universitaria - Lodi webcams of Italy project. by
Veduta della Casa Universitaria in Lodi © Graziano Panfili



Spiaggia di Porto San Giorgio Mare Adriatico - Fermo webcams of Italy project. by Graziano Panfili
Spiaggia di Porto San Giorgio, Mare Adriatico © Graziano Panfili
You could, of course, make the case for biometric surveillance as a temporary measure taken during a state of emergency. It would go away once the emergency is over. But temporary measures have a nasty habit of outlasting emergencies, especially as there is always a new emergency lurking on the horizon. My home country of Israel, for example, declared a state of emergency during its 1948 War of Independence, which justified a range of temporary measures from press censorship and land confiscation to special regulations for making pudding (I kid you not). The War of Independence has long been won, but Israel never declared the emergency over, and has failed to abolish many of the “temporary” measures of 1948 (the emergency pudding decree was mercifully abolished in 2011). 
Even when infections from coronavirus are down to zero, some data-hungry governments could argue they needed to keep the biometric surveillance systems in place because they fear a second wave of coronavirus, or because there is a new Ebola strain evolving in central Africa, or because . . . you get the idea. A big battle has been raging in recent years over our privacy. The coronavirus crisis could be the battle’s tipping point. For when people are given a choice between privacy and health, they will usually choose health.

The soap police

Asking people to choose between privacy and health is, in fact, the very root of the problem. Because this is a false choice. We can and should enjoy both privacy and health. We can choose to protect our health and stop the coronavirus epidemic not by instituting totalitarian surveillance regimes, but rather by empowering citizens. In recent weeks, some of the most successful efforts to contain the coronavirus epidemic were orchestrated by South Korea, Taiwan and Singapore. While these countries have made some use of tracking applications, they have relied far more on extensive testing, on honest reporting, and on the willing co-operation of a well-informed public. 
Centralised monitoring and harsh punishments aren’t the only way to make people comply with beneficial guidelines. When people are told the scientific facts, and when people trust public authorities to tell them these facts, citizens can do the right thing even without a Big Brother watching over their shoulders. A self-motivated and well-informed population is usually far more powerful and effective than a policed, ignorant population
Consider, for example, washing your hands with soap. This has been one of the greatest advances ever in human hygiene. This simple action saves millions of lives every year. While we take it for granted, it was only in the 19th century that scientists discovered the importance of washing hands with soap. Previously, even doctors and nurses proceeded from one surgical operation to the next without washing their hands. Today billions of people daily wash their hands, not because they are afraid of the soap police, but rather because they understand the facts. I wash my hands with soap because I have heard of viruses and bacteria, I understand that these tiny organisms cause diseases, and I know that soap can remove them. 



"a Reggia di Caserta webcams of Italy project. by
The Royal Palace of Caserta © Graziano Panfili



"Lungomare di Forte dei Marmi - Versilia. webcams of Italy project. by
Lungomare di Forte dei Marmi, in Versilia © Graziano Panfili
But to achieve such a level of compliance and co-operation, you need trust. People need to trust science, to trust public authorities, and to trust the media. Over the past few years, irresponsible politicians have deliberately undermined trust in science, in public authorities and in the media. Now these same irresponsible politicians might be tempted to take the high road to authoritarianism, arguing that you just cannot trust the public to do the right thing. 
Normally, trust that has been eroded for years cannot be rebuilt overnight. But these are not normal times. In a moment of crisis, minds too can change quickly. You can have bitter arguments with your siblings for years, but when some emergency occurs, you suddenly discover a hidden reservoir of trust and amity, and you rush to help one another. Instead of building a surveillance regime, it is not too late to rebuild people’s trust in science, in public authorities and in the media. We should definitely make use of new technologies too, but these technologies should empower citizens. I am all in favour of monitoring my body temperature and blood pressure, but that data should not be used to create an all-powerful government. Rather, that data should enable me to make more informed personal choices, and also to hold government accountable for its decisions. 
If I could track my own medical condition 24 hours a day, I would learn not only whether I have become a health hazard to other people, but also which habits contribute to my health. And if I could access and analyse reliable statistics on the spread of coronavirus, I would be able to judge whether the government is telling me the truth and whether it is adopting the right policies to combat the epidemic. Whenever people talk about surveillance, remember that the same surveillance technology can usually be used not only by governments to monitor individuals — but also by individuals to monitor governments. 
The coronavirus epidemic is thus a major test of citizenship. In the days ahead, each one of us should choose to trust scientific data and healthcare experts over unfounded conspiracy theories and self-serving politicians. If we fail to make the right choice, we might find ourselves signing away our most precious freedoms, thinking that this is the only way to safeguard our health.

We need a global plan

The second important choice we confront is between nationalist isolation and global solidarity. Both the epidemic itself and the resulting economic crisis are global problems. They can be solved effectively only by global co-operation. 
First and foremost, in order to defeat the virus we need to share information globally. That’s the big advantage of humans over viruses. A coronavirus in China and a coronavirus in the US cannot swap tips about how to infect humans. But China can teach the US many valuable lessons about coronavirus and how to deal with it. What an Italian doctor discovers in Milan in the early morning might well save lives in Tehran by evening. When the UK government hesitates between several policies, it can get advice from the Koreans who have already faced a similar dilemma a month ago. But for this to happen, we need a spirit of global co-operation and trust. 
Countries should be willing to share information openly and humbly seek advice, and should be able to trust the data and the insights they receive. We also need a global effort to produce and distribute medical equipment, most notably testing kits and respiratory machines. Instead of every country trying to do it locally and hoarding whatever equipment it can get, a co-ordinated global effort could greatly accelerate production and make sure life-saving equipment is distributed more fairly. Just as countries nationalise key industries during a war, the human war against coronavirus may require us to “humanise” the crucial production lines. A rich country with few coronavirus cases should be willing to send precious equipment to a poorer country with many cases, trusting that if and when it subsequently needs help, other countries will come to its assistance
We might consider a similar global effort to pool medical personnel. Countries currently less affected could send medical staff to the worst-hit regions of the world, both in order to help them in their hour of need, and in order to gain valuable experience. If later on the focus of the epidemic shifts, help could start flowing in the opposite direction. 
Global co-operation is vitally needed on the economic front too. Given the global nature of the economy and of supply chains, if each government does its own thing in complete disregard of the others, the result will be chaos and a deepening crisis. We need a global plan of action, and we need it fast. 
Another requirement is reaching a global agreement on travel. Suspending all international travel for months will cause tremendous hardships, and hamper the war against coronavirus. Countries need to co-operate in order to allow at least a trickle of essential travellers to continue crossing borders: scientists, doctors, journalists, politicians, businesspeople. This can be done by reaching a global agreement on the pre-screening of travellers by their home country. If you know that only carefully screened travellers were allowed on a plane, you would be more willing to accept them into your country. 



Il Duomo - Firenze. webcams of Italy project. by
The Duomo in Florence © Graziano Panfili



Torre San Giovanni Lecce webcams of Italy project. by Graziano Panfili
Torre San Giovanni, in Lecce © Graziano Panfili
Unfortunately, at present countries hardly do any of these things. A collective paralysis has gripped the international community. There seem to be no adults in the room. One would have expected to see already weeks ago an emergency meeting of global leaders to come up with a common plan of action. The G7 leaders managed to organise a videoconference only this week, and it did not result in any such plan. 
In previous global crises — such as the 2008 financial crisis and the 2014 Ebola epidemic — the US assumed the role of global leader. But the current US administration has abdicated the job of leader. It has made it very clear that it cares about the greatness of America far more than about the future of humanity. 
This administration has abandoned even its closest allies. When it banned all travel from the EU, it didn’t bother to give the EU so much as an advance notice — let alone consult with the EU about that drastic measure. It has scandalised Germany by allegedly offering $1bn to a German pharmaceutical company to buy monopoly rights to a new Covid-19 vaccine. Even if the current administration eventually changes tack and comes up with a global plan of action, few would follow a leader who never takes responsibility, who never admits mistakes, and who routinely takes all the credit for himself while leaving all the blame to others. 
If the void left by the US isn’t filled by other countries, not only will it be much harder to stop the current epidemic, but its legacy will continue to poison international relations for years to come. Yet every crisis is also an opportunity. We must hope that the current epidemic will help humankind realise the acute danger posed by global disunity. 
Humanity needs to make a choice. Will we travel down the route of disunity, or will we adopt the path of global solidarity? If we choose disunity, this will not only prolong the crisis, but will probably result in even worse catastrophes in the future. If we choose global solidarity, it will be a victory not only against the coronavirus, but against all future epidemics and crises that might assail humankind in the 21st century. 
Yuval Noah Harari is author of ‘Sapiens’, ‘Homo Deus’ and ‘21 Lessons for the 21st Century’
Copyright © Yuval Noah Harari 2020
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Letters in response to this article:

Séries - Aber Bergen S1







terça-feira, 19 de maio de 2020

Séries - The Halcyon Hotel





Reflexão - Vários

(sublinhados meus)


(Francisco José Viegas no Público)


Se o sistema de valores culturais privilegia o espectáculo, o ‘lifetsyle’, os gatinhos nas redes sociais, a velocidade, a superficialidade, os erros ortográficos – esperava-se que o sistema educativo público tomasse entre mãos essa tarefa nobre e urgente de melhorar e ampliar o acesso à leitura, de permitir que as bibliotecas públicas adquirissem, gerissem e aumentassem os seus fundos bibliográficos (e não no sentido de criar “bibliotecas escolares” que, com poucas excepções, separam os estudantes da comunidade e da notável rede de bibliotecas municipais, que – já agora – corre o risco de colapsar), de exigir que a escola promovesse a leitura dos clássicos (porque são eles o grande instrumento para a “inclusividade”) e de espaços de partilha de livros. Se esta situação se mantiver – falo de incúria e indiferença, reunidas –, é provável que, dentro de algum tempo, “o livro” seja mesmo essa raridade atrevida, como queriam os autores mais enclausurados ou os elitistas mais avaros. Mas, repito, por incúria e indiferença

(Gonçalo Portocarrero de Almada no Observador)
...
A versão portuguesa deste comportamento tem um nome próprio: Chico-espertismo. Com uma sabedoria aprendida ao balcão da taberna e atestada pela suprema autoridade científica do barbeiro, que já nos tempos de D. Quixote era uma autoridade indiscutível na aldeia, o Chico-esperto sabe perfeitamente que os norte-americanos nunca foram à lua. Também sabe que as alterações climáticas se devem sobretudo aos foguetões que, de tanto furarem o céu, deram cabo do clima. Sabe igualmente que há bichos mais inteligentes do que os seres humanos o que, a julgar pelo próprio, talvez não seja falso. Graças a este seu universal conhecimento, adquirido na universidade da vida, entre copos de vinho e cortes de cabelo, o Chico-esperto acha que, aqui em Portugal, nunca acontece nada e, portanto, também não há-de ser agora que vai ocorrer uma catástrofe.

(Helena Matos no Observador")
...
Num país escandinavo, por exemplo, o que é público é de todos; em Portugal, o que é público não é de ninguém. No norte da Europa, cada morador tem a obrigação de retirar a neve que se deposita à frente da sua casa; em Portugal, há quem deite papéis, ou beatas, para a rua. Confesso que, quando vejo as carruagens dos nossos comboios grafitadas, sinto vergonha alheia: não percebo a irresponsabilidade dos ‘artistas’, nem a sua impunidade, nem o desleixo de quem permite que o património público seja sistematicamente vandalizado. E deixa-me profundamente irritado ver alguém não deficiente estacionar, mesmo que seja por breves instantes, no espaço reservado a quem, tendo essa condição, tem essa necessidade e indiscutível direito.


(João Miguel Tavares no Público)
...
Pergunto: há mesmo? Ou a única coisa que o Governo está a fazer neste momento é responder a um pânico social desproporcionado e àquilo que antecipa ser a recusa dos professores em regressar às escolas sem as
devidas garantias de segurança?
Expliquem-me devagarinho, como se eu fosse muito burro: 1) se o crescimento diário das infecções com coronavírus estabilizou abaixo dos 5%; 2) se as medidas de contenção já revelaram a sua efcácia; 3) se tudo indica que se tenha atingido o planalto da epidemia; 4) se a nossa capacidade hospitalar ainda está longe do limite; 5) se há mais meios a
caminho (nomeadamente ventiladores) para reforçar essa capacidade; 6) se o número de pessoas internadas nos cuidados intensivos tem vindo a diminuir; 7) se só vai existir vacina daqui a pelo menos um ano; 8) se a população aos poucos precisa de ganhar imunidade; 9) se a população
activa terá em breve de sair de casa; 10) se os coronavírus tendem a recuar nos meses de Verão para depois regressarem no Inverno; 11)
se a prioridade deve ser a economia, porque a saúde parece controlada; 12) se já todos percebemos que vamos ter de aprender a viver com isto — se esta dúzia de factos está agora bem à frente dos nossos olhos, expliquem-me, por favor, qual é exactamente a razão para o Governo nos dizer que só o 11.º e o 12.º anos é que podem regressar às aulas antes de Setembro, e nem sequer isso está assegurado?
Sinceramente, não percebo.
Mas, mais do que não perceber, aquilo que me está a irritar sobremaneira é a unanimidade instalada. Com a ilustre excepção de meia dúzia de teimosos que levam pancada com fartura, vejo demasiada gente a abanar a cabeça em sinal de reverente obediência a decisões que não justi􀃆cam este grau de consenso. Que mais não seja, haveria certamente outras opções para escolas e alunos que mereciam um debate que não existiu. Por que não olhar para os números de infecções no início de Maio? Por que não prolongar as aulas até ao 􀃆nal de Julho? Por que não ganhar nos meses de Verão aquilo que podemos vir a precisar, em novas quarentenas, nos meses de Inverno? Onde quase todos vêem prudência, eu vejo falta de ambição — e, sobretudo, um enorme dé􀃆ce de discussão e de confronto de ideias alternativas.
Se toda a unanimidade é burra, mais umas semanas como estas e acabamos a zurrar.

(Alberto Gonçalves no Observador)
...
A autoridade (sem aspas) decorre da legitimidade. Pelo glorioso desempenho na história da Covid, as “autoridades” (com aspas) não possuem sombra de legitimidade. Os espécimes que decretam normas diárias a fim de regulamentar e restringir o nosso comportamento são aqueles demonstraram um formidável desnorte logo na recepção do vírus, que aconselharam visitas a lares de velhos, que proclamaram o esplendor de um SNS que permite a morte de milhares de pacientes para salvaguardar umas dúzias em cuidados intensivos, que recomendaram o abastecimento em “hortas de amigos” por troca com o supermercado, que proibiram e sugeriram e proibiram repetidamente o uso de máscaras enquanto não descobriram socialistas que as fabricassem, que distribuem a realização de testes médicos a compinchas do partido, que fecharam concelhos às pessoas e abriram aos camaradinhas as portas de “Abril” e do 1º de Maio, que cancelaram festivais de Verão e ponderam a excepção do “Avante!”, que transformaram a gestão anedótica de um problema num “milagre” para consumo de pacóvios, que aproveitaram a docilidade dos nativos para pisá-los com redobrada força, que rebentaram escusadamente a economia e negaram com insolência a chegada da austeridade, que supõem que os negócios particulares sobrevivem aos caprichos de parasitas, que nem por um instante abandonaram a propaganda para reparar nas multidões a caminho de uma miséria sem nome, que driblam a Sagrada Constituição em prol da perpetuação do abuso, que mentem e mentem e voltam a mentir até ao ponto em que a mentira deixa de ser necessária face a uma população sob anestesia. Estes espécimes, meus caros, que nos intervalos da Covid fingem não recordar que despejaram outros 850 milhões nos compadres do Novo Banco, não têm legitimidade para mandar em vocês. Mas muitos portugueses são suficientemente infantis para obedecer-lhes.
Eu não estou para isso. Do senhor Costa (o prof. Marcelo já não conta) ao senhor agente da PSP, passando pelos directorzinhos, os secretariozinhos, os autarcazinhos e restantes bonequinhos do “serviço público”, as leis, directivas e conselhos dessa gente sobre a “pandemia” não me dizem respeito – e não respeito essa gente. Há dois meses que preservo a minha rotina da histeria em redor. Não me “confinei”. Viajei pelos locais que quis sempre que quis. Visitei quem me apeteceu e a quem apeteceu receber-me. Estive com as pessoas que estimo, incluindo, com a aprovação dela, uma mãe de 75 anos. Jantei regularmente acompanhado (veja lá, ó sr. Póssamos). Usei máscara apenas para ir ao dentista. Fui ao dentista. Fui a cafés que me serviram à mesa (bandidos!). Não fui a restaurantes por sumiço destes. Não fui ao barbeiro por não ter cabelo. Não contaminei ninguém. Ninguém me contaminou. Sou hipocondríaco e, adoptado algum bom senso, nunca tive medo do vírus. Tenho medo dos que têm medo, e que por medo abdicam da responsabilidade e se entregam nas mãos de cínicos ou, na melhor das hipóteses, incapazes. Esses que cumpram ordens e se mantenham em casa ou onde os mandarem ficar: de qualquer modo e em qualquer lugar, são prisioneiros. E gostam.


(Tiago Marcos no "i")
...
Parece-me ainda relevante questionar como pode ser aceitável que, num momento em que os Estados estão em risco de colapso económico e social, os nossos líderes percam tempo a discutir o regresso do futebol profissional, mas não das outras modalidades desportivas ou espetáculos de risco equivalente. É esta uma atividade essencial?


Reflexão - LBC (Costa e Ventura)


Costa e Ventura; dois Ihhhh!!-cones...

Já passei aquela fase, creio, em que as pessoas ainda se preocupam com o que pensam delas. Talvez num ou noutro momento ainda alimente um sentimento de vergonha quando, em público, passo por um daquelas situações ridículas, seja quando tropeço por não levantar os pés como devia, seja - e como é muito meu hábito -, andar de braguilha aberta.
Custa-me assim, cada vez menos, assumir que as pessoas que, como os políticos, se deviam preocupar com o seu semelhante, o não façam.
Da mesma forma, já há muito mais tempo que deixei de confiar nos nossos políticos. Fosse pelas sucessivas trapaças, ou pelas sucessivas exibições de falta de ética ou de conduta social, há mais de 30 anos que deixei de colaborar na eleição das sucessivas hordas de trapaceiros que, diligente e matreiramente insistem em "conduzir-nos". É assim: "não gosto de levar pancada", para não ser mais brejeiro...

Vem este intróito a propósito da Festa do Avante. "Não há festa como esta", recorde-se.

Costa e Ventura têm várias características comuns; umas que não fazem mossa, como serem ambos do Benfica. Outras, como a de serem políticos e tratarem o Povinho como estúpidos, que - uma vez mais - me não surpreende...
Um apela aos mais elementares recalcamentos do homem, ressuscitando toda a espécie de fantasmas sejam eles contra os ciganos, contra os pretos, contra os emigrantes ou contra algo muito fácil de acordar a ira de cada um. "Eles não percebem"- pensa o rapaz...
O outro, mais fino, e bem mais recatado, consensualmente reconhecido (vejam-se as votações e as sondagens...) como mais equilibrado, envia -nos (mais ) uma pérola como "Não se pode proibir actividade política", a propósito da festa do Avante.

Fui uma vez à Festa do Avante ver os Xutos. Durante as 4 horas em que lá estive presenciei muitas manifestações, mas nenhuma actividade política. Reconheço que o universo da amostra não é significativo. Mas pelo que vejo e oiço, estou plenamente convencido que a Festa do Avante deveria ser incluída no cômputo geral das proibições, a par da "festa do Pontal" e de todas as outras de cariz análogo.

Custa-me que a populaça, a malta, os coitadinhos, os pobrezinhos da cuca, continuem a ser enganados subliminarmente sem uma queixa, sem um lamento, rindo, cantando, enquanto avançam para mais um (...) precipício.

Custa-me porque arrastam com eles quem não gosta, não quer, não escolheu, mas avisou  dos perigos deste caminho.



Costa and Ventura; two Ihhhh!! - cons...

I've passed that stage, I think, where people still care about what they think of them. Perhaps at one moment or another you still feed a feeling of shame when, in public, I go through one of those ridiculous situations, either when I stumble because I don't lift my feet as I should, or - as is my habit - to walk with an open fly.
It is so hard for me to assume that people who, like politicians, should be concerned about their fellow men, do not.
Likewise, i have stopped trusting our politicians for much longer. Whether by successive cheating, or by successive displays of lack of ethics or social conduct, for more than 30 years I have stopped collaborating in the election of successive hordes of cheaters who diligently and on a sneaky way insist on "lead us". It's like, "I don't like to get beat up," so I don't get beat up anymore.

This introduction comes about the "Festa of the Avante", an annual celebration put up by the communist portuguese party (PCP). "There's no party like this," it is published everywhere.

Costa and Ventura have several common characteristics; some that do not immediate damage as they are both benfica fans. Others, such as being politicians and treating the mob  as stupid, which - once again - does not surprise me...
One appeals to man's most elementary repressions, resurrecting all kinds of ghosts whether they are against gypsies, against blacks, against emigrants or against something very easy to awaken the wrath of each one.
The other, thinner, and much more demure, consensually recognized (see the elections and the polls...) as more balanced, sends us a pearl (another one) as
"Political activity cannot be prohibited", concerning the feast of the Avante.

I went to the Feast of the Avante once to see the Xutos, a band. During the four hours I was there I witnessed many demonstrations. No political activity. I recognize that the universe of the sample is not significant. But from what I see and hear, I am fully convinced that the Feast of the Avante should be included in the general reckoning of prohibitions, along with the "feast of Pontal" and all others of an analogous nature.

It is hard for me that the people, the people, the poor things, the poor cuckoo, continue to be deceived subliminally without a complaint, without a lament, laughing, singing, as they advance to another (...) precipice.

It hurts me because they drag with them who do not like, do not want, did not choose, but warned of the dangers of this path.