sexta-feira, 1 de março de 2019

Reflexão - A. Lobo Antunes

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Não imaginas a quantidade de tempo que fiquei quieto, a contemplar o papel branco na mesa. Agora no México achei-te melancólico e inquieto, distante, cansado, e vim de lá a pensar muito em ti, amigo, que é uma palavra que não digo muitas vezes. Amigo. Sempre foste um homem complexo, por vezes contraditório, por vezes imprevisível. Ou seja, somos um bocado parecidos. E gostava de ti, gosto de ti, mesmo da tua ironia, da tua ocasional ferocidade. Nada é fácil, não é, tudo é excepcional. A tua partida, que merda, faz-me sofrer. Quero-te mais do que pensava. Se eu mandasse punha-te aqui ao meu lado, não importa onde porque nos demos bem um com o outro em toda a parte. Claudio, hermanito, se um dia destes tiveres uma horazita livre lembra-te de mim. Ainda não fomos ao Uruguai juntos, por exemplo. Pois não? Se calhar o grande Felisberto Hernández anda por lá à nossa espera e tu sempre gostaste de escritores.

(A. Lobo Antunes na Visão)

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