terça-feira, 7 de maio de 2013

Reflexão-Alberto Gonçalves


Bola para a frente


Por Alberto Gonçalves 

OS CANAIS noticiosos passaram a noite a transmitir o oposto de uma notícia. Com repórteres nas saídas do Estádio da Luz e na rotunda do Marquês de Pombal, perguntou-se centenas de vezes a adeptos benfiquistas se tinham gostado da vitória do Benfica. A expectativa face às respostas fazia tremer o espectador. Além disso, as respostas possuíam enorme importância em si mesmas: nos dias que correm, não me lembro de nada tão essencial para o futuro colectivo quanto um clube da bola eliminar uns turcos e atingir a final de um torneio europeu. Aliás, houve um inquiridor ou um inquirido que ressalvou exactamente o facto de o triunfo no campo compensar o que sucede fora dele. Isto é, perante a crise, valem-nos as alegrias do futebol.

É um raciocínio possível. E, principalmente, uma solução viável. Em lugar de tentarmos, pelos vistos em vão, controlar o défice, estancar o desemprego e, em suma, salvar a pátria, basta que o Estado invista tudo na produção de equipas imbatíveis, capazes de monopolizar as conquistas de torneios internacionais e manter uma população falida sob euforia permanente. Afinal, que interessa o T2 por pagar se o emblema do nosso coração só nos dá felicidade? E que interessariam o aumento de impostos, a redução dos subsídios e o carácter irreformável da máquina pública se o Benfica e o Porto e o Sporting e o Braga e o Sacavenense humilhassem adversários estrangeiros semana sim, semana não? 

Quando se diz que o povo não aguenta mais sacrifícios, subestima-se o povo. Após o desafio com o Fenerbahçe (?), um cartaz empunhado por devotos rezava: "Benfica, se jogasses no céu morreria para te ver". Sacrifícios? Ai aguenta, aguenta, incluindo o último. E o penúltimo, que é ouvir o treinador dos populares "encarnados", hoje elevado a alturas celestiais, proferir a já imortal frase: "Fomos uma equipa que éramos melhores." Portugal também foi um país que éramos fantásticos. Foi. Éramos. A exactidão linguística é, como a bola, fundamental. 

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